Porque em meio as comemorações sobre a mulher
e neste desafio eu resolvi trazer um texto que fala de homem e violência contra
eles? Porque acima dos papéis de gênero postos pela sociedade, somos seres
humanos, somos seres diferentes e não desiguais. Somos seres complementares que
formam a raça humana. A libertação, a equidade para com mulheres, a justiça
para elas, também é para os homens. A superação desses papéis pré-estabelecidos
para homem e mulher é uma libertação para todos e para os homens. Além de
pensar em nossas questões, precisamos também falar sobre os homens, pensar a
questão masculina, falar da violência que sofrem e da formação do papel
masculino em sociedade. Então, vamos lá:
Terminei o curso sobre violência doméstica
entre parceiros íntimos, que incluiu homens como vítima de violência, praticada
por suas parceiras e/ou parceiros.
Me chamou atenção, algo que já
havia refletido, mas, não lido, como se dá a construção da masculinidade. Ora,
assim como não se nasce mulher, mas, tornamo-nos mulher, já dizia Simone de
Beauvoir, também homem não nasce homem, tornar-se homem. Ser mulher e ser homem
não é algo dado, determinado biologicamente, mas, uma construção social,
cunhada por séculos e séculos de ideias e ideologias do ser homem.
Interessante é que o ser homem se
constrói na oposição ao ser feminino, ou seja, tudo que seja “feminino”, ou
“historicamente construído como feminino”: a fragilidade, a emotividade, a
fraqueza, a passividade, a inconstância, a alma cheia de caprichos misteriosos,
o recato, uma certa malignidade inata destruidora dos homens que precisa ser dominada,
sufocada, adestrada. Sendo assim uma mulher sem o governo de um homem, é
desgovernada. Historicamente as mulheres foram seres sem alma, já foram seres
tidos como estúpidos por terem seus cérebros menores, já foram desprezadas
pelos seios e tidas como imundas devido a sua menstruação.
Bem, se a construção do masculino
é em oposição ao que é “feminino”, o masculino então é: a potência, a razão, a
força, a impetuosidade, a conquista, a linearidade da alma, a violência como
uso de conquista e dominância sobre a mulher e sobre outros homens. Homens
dominam pela força, pela inteligência, pela acumulação de riquezas. Homens dominam
tanto mulheres e outros homens. Se assim não for será incapaz.
Não é à toa que em determinadas
sociedades a entrada de um jovem no mundo masculino é precedida de provas que
demonstre sua força, virilidade e coragem. Um homem que não carrega em si esses
adjetivos, não é um homem, é um maricas e essa visão está tão fundamentada
socialmente que as próprias mulheres enfatizam essa construção.
Quando querem praticar violência
contra seus parceiros (entre homens a incidência maior é da psicológica),
mulheres usam preferencialmente atingi-los nesses “marcos de masculinidade”
dizendo-o menos homem ou um homem fracassado. Ou seja, se um homem não for
capaz de dominar pela força, pela inteligência e principalmente hoje pela
acumulação de riquezas, ele fracassou em seu papel masculino para os outros
homens e para com as mulheres, para sociedade enfim que o tem como:
conquistador, provedor e ordenador do espaço também privado, isto é, a casa, a
família.
Para cumprir seu papel social um
homem não pode demonstrar seus sentimentos, ele logo é tachado de efeminado, um
homem precisa “ser um bode”, lembram do ditado “segurem suas cabritas que meu
bode tá solto!”? Ele tem que ser “Macho Alfa”, conquistador, ter experimentado
o sexo e ser experiente sobre o assunto. Ele tem que sobrepor-se a outros
homens, dominar outros homens, seja por sua força, sua inteligência ou sua
acumulação de riquezas. Por isso ele é potência: conquistador, desbravador, dominador.
Por fim, além de dominar e
destacar-se no espaço público, o homem também é o dominador e ordenador do
espaço privado.
Mas, o que acontece quando falham
nesse múltiplo papel de dominância completa. Não são mais homens, falharam em
ser homens. Suas mulheres os violentam psicologicamente porque falharam no
papel destinado a ele, tanto no público, quanto no privado.
Ser um homem na multidão é ser
menos homem. Ser um homem desprovido de potência, inteligência, dinheiro, é ser
menos homem. Um negro é menos homem, a não ser que conquiste as dominâncias dos
brancos, ou assuma o estereotipo da hirpersexualidade, sua ferocidade, a mítica
do pênis grande, do negão. Então ele será homem pela conquista da sexualidade
potente e até mesmo desgovernada.
Contudo, faz bem aos homens terem
que corresponder a essas expectativas sociais? Comecemos por um fato simples, a
falta de cuidado com a saúde, a maioria dos homens são descuidados com a saúde,
não querem ir ao médico, porque seria um sinal de fraqueza, a (des) potência. E
quando vão por vezes é tarde demais.
A competição de “macho alfa”
acaba furtando alguns homens de conhecer e relacionar-se intimamente com uma
mulher. Aquele que conhece muitas mulheres, na verdade, não conhece nenhuma.
A busca da dominância no espaço público
acaba por reverberar em violência. Porque humilhado por outro homem que tem
sobre ele poder, não podendo ser o dominante por questões de dinheiro, status
social, saber, alguns homens buscam a dominância da forma mais primitiva: a
força. Contra outros homens e no espaço doméstico, contra mulher e filhos. Uma
das várias explicações para a Violência de Gênero.
Se falhou na ordenação, provisão
e dominância da casa, então falhou mais ainda na sua masculinidade. É interessante
notar como a sociedade observa isso, ou seja, uma casa sem “autoridade de homem”
é uma casa sem governo, frágil, “aberta a bagunça”, “aberta a conquista de
outro homem ou homens”, “as mulheres desgovernadas e a disposição”.
Pergunto: ser homem é isto mesmo?
Esses papéis “postos” para nós tem feito bem a humanidade, as sociedades? Ao homem
e a mulher?
Há mesmo uma única maneira de ser
homem, uma única maneira de ser mulher? Ou muitas e variáveis maneiras de ser
homem e ser mulher conforme cada indivíduo?
Então é hora de repensarmos
nossos papeis, e também na educação que damos aos filhos: meninos e meninas. Se
queremos uma nova sociedade, passa no repensarmos no papel social de homens e
mulheres. O feminismo também fala ao homem. A mudança do papel feminino, os
questionamentos sobre as questões de gênero, também fala sobre os homens. A
revolução começada na queima dos soutien também fala dos homens.
Então vamos falar sobre isso?
Vamos falar do é ser homem? Será que ser homem é isso mesmo ou existe outra
forma ou outras formas de se construir socialmente como homem e mulher em
nossas sociedades?
Com a palavra os homens....
Cândida Maria Ferreira da Silva
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