É
costume creditar a ideia de cidadania na antiguidade aos romanos e gregos,
historicamente os primeiros a definirem de forma jurídica o status de cidadão.
Contudo, o primeiro povo a ter uma legislação que ordenasse as relações sociais
e buscasse a inclusão foram os Hebreus.
Jaime
Pinsky em seu livro História da Cidadania mostra-nos no capitulo intitulado Os
Profetas Sociais e o Deus da Cidadania como o povo hebreu através do
Deuteronômio e dos Profetas mostram a preocupação com a equidade social e
principalmente com os mais necessitados do grupo.
O
próprio caráter da formação do povo hebreu passando pela escravidão de
quatrocentos anos no Egito propicia uma formação diferenciada de outros povos.
Credita-se
aos judeus a disseminação do monoteísmo, mas, sabe-se que outros povos também
praticavam em tempos diversos a adoração monoteísta. Contudo, o Deus adorado
pelos judeus tinha um diferencial dos que eram adorados na mesma época. Para
além dos sacrifícios costumeiramente feitos, celebrações, esse era um Deus que
exigia uma vida ética. Para ele nada adiantava os sacrifícios se não fosse
consequência de uma vida ética, principalmente no cuidado com o pobre.
“A
doutrinação dos chamados profetas sociais estabelece os fundamentos do monoteísmo
ético, que é, por sua vez, a base das grandes religiões ocidentais
(cristianismo e islamismo, além do judaísmo) e se constitui, provavelmente, na
primeira expressão documentada e politicamente relevante (até por suas
consequências históricas) do que poderíamos chamar de pré-história da
cidadania.” ( Pinsky, 2006, 17)
O Deus
tribal que vencia as guerras era, também, o Deus que exigia uma vida reta e que
punia severamente a atitude de indiferença em relação aos seus semelhantes. O
Senhor Jeová demonstrar sua preocupação não apenas 5 com a santidade de seu povo, mas que, essa santidade se
refletisse em relações mais justas entre os homens. Desta forma o Deus hebreu
foi uma das primeiras divindades, talvez a única a preocupar-se com a cidadania
e estabelecer as bases para seu exercício, como forma de virtude do homem reto.
Na lei
acerca da justiça, Deus ordena ao povo de Israel: “Não perverterás o
direito do teu pobre na sua demanda”. Êxodo 23. 6.
O homem
justo, cumpridor da lei, era aquele que não praticava nem o roubo, a usura, a
cobiça e se responsabilizava pelos pobres da sua terra, não se esquecendo de
lhes fazer justiça e não lhes pervertendo o direito.
Para
garantir que não houvesse fome entre os necessitados e estrangeiros, Deus
determina a Lei da Rebusca: “Quando também fizerdes a colheita
da vossa terra, o canto do teu campo não segarás totalmente, nem
as espigas caídas colherás da tua sega. Semelhantemente não rabiscarás
a tua vinha, nem colherás os bagos caídos da tua vinha; deixa-los- ás
ao pobre e ao estrangeiro. Eu sou o Senhor vosso Deus”. Levíticos 23.
9-1. O dono das terras deveria colher somente aquilo que lhe fosse
necessário e não se esquecer de repartir sua colheita com aqueles que não
possuíam terras e necessitavam de comida.
No Êxodo,
mais propriamente no decálogo, os quatro primeiros mandamentos versam sobre o
relacionamento entre Deus e os homens (os seis últimos entre o homem e seu
próximo). Os seis últimos mandamentos poderiam ser resumidos como a garantia de
que um não irá desapropriar o outro, seja em suas propriedades, seja em suas
relações afetivas. A expropriação, a opressão, a cobiça desmedida em possuir
mais do que aquilo que se pode viver é condenada no decálogo e é quebra dos
mandamentos de
Deus. Uma
consequente quebra dos quatro primeiros mandamentos, porque ninguém que viva os
quatro primeiros mandamentos, poderá deixar de viver os seis últimos. Seria
hipocrisia.
Na
legislação social que regia a vida em sociedade de Israel, o Deus
Hebreu se
apresenta como um Deus da Cidadania observemos a sua preocupação em instruir
Moisés sobre a garantia do direito de todos, principalmente do pobre, do
estrangeiro e da viúva. Como citados acima, vale 6 lembrar
a lei de remissão, quando ao sétimo ano, do uso de terras por dívida, o judeu
era obrigado a devolver a terra aos seus donos: “Guarda-te, que não
haja palavra perversa no teu coração, dizendo: Vai-se aproximando o
sétimo ano, o ano da remissão; e que o teu olho seja maligno para com
teu irmão pobre, e não lhe dês nada; e que ele clame contra ti ao Senhor,
e que haja em ti pecado”. Deuteronômios 15.9
Em Rute
3. 8, encontramos, também, a prática da Lei do Remidor, para o amparo da viúva
sem descendente, a Lei da Vinha idêntica a Lei da Rebusca, a Lei da Remissão do
escravo após sete anos (Deuteronômio 15); a alforria
(Deuteronômio
15.12), leis diversas sobre o relacionamento em sociedade
(Deuteronômio
23.11-25) e a Lei da Herança das filhas (Números 36).
Os livros
poéticos, Salmos e Provérbios, nos dão conta do caráter do
Deus da
Cidadania.
Observe
os seguintes textos:
“Tu o
viste, porque atentas para o trabalho e enfado, para o retribuir com tuas mãos;
a ti o pobre se encomenda; tu és o auxílio do órfão. Salmos”. 10. 14
“Compadecer-se-á
do pobre e do aflito, e salvará as almas dos necessitados”. Salmos 72. 13
“Fazei
justiça ao pobre e ao órfão; justificai o aflito e o necessitado”. Salmos 82.3
“Pois se
porá à direita do pobre, para o livrar dos que condenam a sua alma”. Salmos
109.31
“O que
oprime o pobre insulta àquele que o criou, mas o que se compadece do
necessitado o honra”. Provérbios. 14.31
“O que
escarnece do pobre insulta ao seu Criador, o que se alegra da calamidade não
ficará impune”. Provérbios 15.5
Os
profetas sociais iniciam sua pregação com a condenação do povo de
Israel ao
cativeiro. São eles os denunciantes de que o povo havia se afastado da ética
social e passara a oprimir o pobre e perverter o direito. Isso mesmo, uma noção
de direito assegurado se fazia presente em toda legislação deste povo, que se
iniciou no século VIII a.C e se estendeu até o período do profetismo. 7
Observemos
a coletânea de falas dos profetas que demonstram isso para nós.
Do
profeta Isaías: “Ai de vocês que adquirem casas e mais casas, propriedades e
mais propriedades, até não haver mais lugar para ninguém e vocês se tornarem os
senhores absolutos da terra!” (Is 5.8, NVI).
Do
profeta Jeremias: “Ai daquele que constrói o seu palácio por meios corruptos,
seus aposentos, pela injustiça, fazendo os seus compatriotas trabalharem por
nada, sem pagar-lhes o devido salário” (Jr 22.13, NVI).
Do
profeta Ezequiel: “Você empresta a juros, visando lucro, e obtém ganhos
injustos, extorquindo o próximo... Mas você me verá batendo as minhas mãos uma
na outra contra os ganhos injustos que você obteve e contra o sangue que você
derramou” (Ez 22.12,13, NVI)
Do
profeta Amós: “Vocês estão transformando o direito em amargura e atirando a
justiça ao chão... impedem que se faça justiça aos pobres nos tribunais” (Am
5.7, 12).
Do
profeta Miquéias: “Ai daqueles que... cobiçam terrenos e se apoderam deles;
cobiçam casas e as tomam... Vocês deveriam conhecer a justiça!
Mas...
arrancam a pele do meu povo e a carne dos seus ossos... Os ricos que vivem
entre vocês são violentos” (Mq 2.1,2; 3.1,2; 6.12, NVI)
Do
profeta Naum: “Ai da cidade sanguinária, repleta de fraudes e cheia de roubos,
sempre fazendo as suas vítimas!” (Na 3.1, NVI)
Do
profeta Habacuque: “A destruição e a violência estão diante de mim; há luta e
conflito por todo lado. Por isso a lei se enfraquece e a justiça nunca
prevalece. Os ímpios prejudicam os justos, e assim a justiça é pervertida...
Ai
daquele que obtém lucros injustos para a sua casa, para
pôr seu ninho no alto e escapar das garras do mal!” (Hc 1.3,4; 2.9, NVI.)
Esses
profetas ao tomar nas mãos a bandeira dos pobres foram grandes revolucionários,
na crítica moral e ética que faziam ao Israel de seu tempo, tentavam regressar
a um passado idealizado de relações sociais diferentes, acreditavam num modelo
de sociedade justa, um parâmetro não existente de relações entre os indivíduos
naquela época. 8
“Pela
primeira vez desde que o mundo era mundo, ouviu-se com tamanha intensidade o
grito dos oprimidos e dos injustiçados.” (Pinsky, 2006, 27)
O Antigo
Testamento nos conta de um Deus que “ouve o clamor do pobre”, “um Deus que
se levanta para auxiliá-lo” e mais do que isso: um
Deus que
legislou a favor deles, garantindo-lhes direitos e condenando severamente a
quem pervertesse e tripudiasse os seus direitos. Esse é um legado que o
monoteísmo ético dos judeus nos deixa e nos faz refletir sobre relações justas
e cidadania. Esses profetas rompem com o Deus do templo, qualquer Deus
engessado, distante, e criam o Deus da Cidadania.
“Por
causa da opressão dos pobres, e do gemido dos necessitados, levantar-me-ei
agora, diz o Senhor; porei em segurança quem por ela suspira”. (Sl 12. 5, NVI)
A idéia
de cidadania nasce na Grécia
Na Grécia
eram considerados cidadãos somente aqueles que estivessem em condições de
opinar sobre os rumos das cidades-estados. Mas, quem estava nessas condições?
Somente um homem livre, que não necessitasse trabalhar para sobreviver, uma vez
que o envolvimento nos negócios públicos exigia dedicação integral. Desta
forma, o número de cidadãos era muito reduzido, que excluíam além dos homens
trabalhadores tais como comerciantes e artesãos, as mulheres, os escravos e os
estrangeiros. Praticamente apenas os proprietários de terras eram livres para
ter o direito de decidir sobre o governo. A cidadania grega era entendida apenas
por direitos políticos, identificados com a participação nas decisões sobre a
coletividade.
“Pertencer
à comunidade da cidade-estado não era, portanto, algo de pouca monta, mas um
privilegio guardado com zelo, cuidadosamente vigiado por meio de registros escritos
e conferidos com rigor. 9
Como já
ressaltava o filosofo grego Aristóteles, fora da cidade-estado não havia
indivíduos plenos e livres, com direitos e garantias sobre sua pessoa e seus
bens. Pertencer à comunidade era participar de todo um ciclo próprio da vida
cotidiana, com seus ritos, costumes, regras, festividades, crenças e relações
pessoais.” (GURINELLO, 2006:35)
Um fator
importante de se observar é o caráter excludente da cidadania, muito diferente
do que compreendemos hoje. Apenas uma classe de cidadãos podia exercer a
plenitude da cidadania havendo até mesmo uma divisão censitária; é a partir das
reformas de Clístenes (509 a.c.), que a cidadania passará a ser estendida a
todos os cidadãos, inclusive com o exercício de cargos públicos. Contudo, é
preciso enfatizar que são cidadãos os homens livres e abastados.
A
igualdade é resultado da organização humana, que por intermédio das
instituições, busca igualar as diferenças, este é o caso da polis, que
tornava os homens iguais através da lei, não ter o acesso à esfera pública
equivalia à perda da igualdade. Assim o indivíduo, destituído da cidadania e
submetido à esfera privada, não usufruía os direitos, vinculada às atividades
de sobrevivência do indivíduo, a esfera privada, era o espaço de sujeição da
mulher, do escravo e dos filhos, todos, destituídos de direitos, ficavam sob o
domínio despótico do chefe de família.
È
importante lembrar que o Estado à época de Roma e Grécia, se podemos assim
chamá-los, não tinha a feição que hoje lhe é conferida; era na verdade, mais um
prolongamento da família, pois esta era a base da sociedade, indivíduo
encontrava-se completamente absorvido pela Cidade- Estado.
Um
cidadão Romano
Em Roma,
assim como na Grécia, cidadania era compreendida como a capacidade para exercer
direitos políticos e civis, distinguindo entre os que possuíam essa qualidade e
os que não a possuíam. Desta forma a cidadania romana era atribuída somente aos
homens livres, mas nem todos os homens livres. Em Roma existiam três classes
sociais: os patrícios que se agrupavam
10 em grandes famílias, conhecidas como gentes e que
descendiam, segundo eles, dos
fundadores de Roma, eram uma oligarquia de proprietários rurais e que mantinham o monopólio dos cargos públicos e mesmo os
religiosos.
Segundo
FUNARI, (2006: 50) “eram, assim, os únicos cidadãos de pleno direito”.
Os
plebeus nasceram como grupo na luta contra os privilégios dos patrícios (vemos
aqui um componente importante da cidadania, a luta de movimentos organizados
por direito plenos) usava-se este termo para englobar todos os cidadãos romanos
sem os mesmos direitos dos oligarcas. Eram os camponeses livres e pobres,
artesãos urbanos, comerciantes e também descendentes dos estrangeiros
residentes em Roma. Os escravos prisioneiros de guerra e os que não saldavam
suas dívidas até o século II a.C, eram basicamente domésticos, sendo
propriedade do patriarca e faziam parte da família, muitas vezes a pobreza dos
camponeses e trabalhadores urbanos podia levá-los a escravidão por dívida.
Havia também os clientes, “aquele que obedecem a um patrício” que mantinham uma
relação de fidelidade ao patrono, a quem deviam apoio e de quem recebiam terra
e proteção. Podiam até mesmo ganhar independência e passar a integrar a plebe,
mas, o contrário podia acontecer também, um plebeu tornar-se cliente, mas isso
não era comum.
Os
plebeus apesar de homens livres, não eram considerados cidadãos, privilégio
exclusivo dos patrícios, que gozavam de todos os direitos políticos, civis e
religiosos. Isso foi motivo para várias lutas internas, entre patrícios e plebeus.
O Rei Sérvio Túlio promoveu uma reforma dando aos plebeus acesso ao serviço
militar e lhes assegurando alguns direitos políticos. Mas somente com a
elaboração da famosa Lei das Doze Tábuas, em 450 a.C e que foi assegurada aos
plebeus uma maior participação política, devido à expansão militar romana.
“Os
conflitos internos na sociedade romana tornaram-se mais evidentes a partir da
Republica, quando os romanos passaram a guerrear em outras cidades sem a retaguarda
etrusca monárquica. O poder de barganha da plebe aumentava, uma vez que o
exército passou a depender cada vez mais dos soldados plebeus, tanto cavaleiros
não patrícios quanto infantes. Isso resultou 11 nas
chamadas “secessões” da plebe, que ameaçavam abandonar a defesa da cidade se os
patrícios não concedessem direitos civis. Os dois grandes episódios do gênero
foram em 494 e 449 a.C, abrindo caminho para conquistas da cidadania.” (FUNARI,
2006:52)
No
Direito Romano fazia uma regulação das diferenças entre cidadãos e não-cidadãos,
o direito civil regulamentava a vida do cidadão, ou seja, patrícios, e o
direito estrangeiro era aplicado a todos os habitantes do império que não eram
considerados cidadãos, pebleus, clientes e escravos.
Em 212
d.C., Caracalla, na célebre Constitutio Antoniniana, concedeu a cidadania
a quase todos os habitantes do Império. As exceções que subsistiram
desapareceram com Justiniano.
Percebemos
que o Direito Romano, apesar de proteger as liberdades individuais e reconhecer
a autonomia da família não assegurava a entre os homens, admitindo a escravidão
e discriminando os despossuídos. Ao lado da desigualdade extrema entre homens
livres e escravos, o Direito Romano admitia a desigualdade entre os próprios
indivíduos livres, institucionalizando a exclusão social.
Contudo,
as lutas populares, tanto de plebeus, como de escravos para assegurar direitos
de cidadania abriram espaço para praticas que serão consolidadas na sociedade
moderna.
Tempos
das Trevas, uma incubadora para a cidadania moderna
Na Idade
Média, ocorrem profundas alterações nas estruturas sociais, sendo esta marcada
por uma sociedade com uma rígida hierarquia de classes sociais: clero, nobreza
e servos (também os vilões e os homens livres).
A Igreja
Católica Apostólica Romana passou a ser instituição básica do processo de
transição para o período medieval. As relações cidadão-Estado, antes reguladas
pelo Império Romano, agora decadente, passam a ser controlada pelos ditames da
Igreja Católica, religião oficial do Império. A doutrina católica, ao alegar a
liberdade e igualdade de todos os homens e a
12 unidade familiar, provocou transformações radicais nas concepções
de direito e de
estado.
O
desmoronamento das instituições políticas romanas e o fortalecimento do catolicismo
romano desembocaram numa reestruturação social que originou o feudalismo. O
feudalismo caracterizava-se por uma sociedade de forma piramidal e relações de dependência
pessoal, abrangendo em sua cúpula rei e suserano e, em sua base, essencialmente,
o campesinato.
E uma
forte ligação com a terra como fonte de origem social. A forma com que um homem
estava ligado a terra determinava sua condição social.
Essa
relação de dependência pessoal de obrigações mútuas originava-se de ato
sacramental e solene e que apresentava duas vertentes: o vassalo, em troca de
proteção e segurança, inclusive econômica, oferecia fidelidade, trabalho e
auxílio ao suserano, que, reciprocamente, investia o vassalo no benefício,
elemento real e econômico dessa relação feudal.
Na idade
média, em razão das estruturas hierarquizadas das classes sociais, o princípio
da cidadania dilui-se. O relacionamento entre senhores e vassalos dificultava
bastante a definição desse conceito. O homem medieval, ou era vassalo, ou
servo, ou suserano; jamais foi cidadão. Os princípios de cidadania e de
nacionalidade dos gregos e romanos estariam “suspensos” e seriam retomados com
a formação dos Estados modernos, a partir de meados do século XVII.
O advento
do capitalismo e a idade moderna
Com o fim
do feudalismo e a ocorrência da formação dos Estados nacionais, a sociedade,
ainda formada e organizada em clero, nobreza e povo, volta a ter uma
centralização do poder nas mãos do rei, cuja autoridade abrangia todo o
território e era reconhecida como legal pelo povo. Língua, cultura e ideais
comuns auxiliaram a formação desses Estados Nacionais.
Estamos
no advento do absolutismo, incrementado pela Reforma Protestante.
13
“(...)
A Revolução Protestante contribuiu consideravelmente para o incremento da
onipotência real. Ela rompeu a unidade da Igreja Cristã, aboliu a supremacia
papal sobre os governantes seculares, fomentou o nacionalismo, reviveu a
doutrina do apostolo Paulo de que “as autoridades constituídas são determinadas
por Deus” e estimulou os governantes da Europa setentrional a estender sua autoridade
sobre assuntos religiosos, tanto quanto sobre os civis” (MacNall. 1989:
425-426).
A
Revolução Protestante, a Revolução Industrial, o nascimento de uma nova classe
e de um novo modo de produção, mudam a face da Europa.
Mesmo com
governos absolutistas, a aristocracia ainda tinha muita força, o que impedia a
nova classe a liberdade necessária para ampliação de seu mercado e de seu novo
modo de vida que distava do modo de vida da nobreza que era baseado no ócio e
prazeres.
“Entretanto,
o indiscutível ponto de partida para o desenvolvimento dos direitos de
cidadania tem sua localização no século XVIII. Foi quando um país se envolveu
naquela que é considerada a primeira revolução burguesa da história. Falamos
aqui, é claro, da Revolução Inglesa. Uma revolução que se inicia em 1640 e tem
sua conclusão quase meio século depois, em 1688, dando origem ao primeiro país
capitalista do mundo. (MONDAINI, 2006: 116)
Inicia-se
um sério questionamento das distorções e privilégios que a nobreza e clero
insistiam em manter sobre o povo. Desenvolve-se a noção de indivíduo, a
revolução industrial incrementa a ciência e o rompimento com a hegemonia da
Igreja Católica e seus ditames levam a sociedade a um crescente afastamento da
religiosidade e rumo à secularização.
“Os
processos de secularização, racionalização e individualização foram jogando por
terra o tradicionalismo embutido na milenar percepção teológica das coisas, alimentada
pela Igreja Católica Romana.” (MONDAINI, 2006:115).
Não
podemos esquecer da Revolução Francesa em 1789 e a Americana 1776 como fatores
decisivos para fundamentação dos princípios de
14 cidadania que teremos hoje, todas elas ocorridas no século XVIII,
o século do
Iluminismo.
A partir
de então, a legitimidade de uma sociedade hierarquizada fundada em privilégios
de nascença perdeu força, começam a despontar figuras que marcariam a História
da cidadania, como Rousseau, Montesquieu,
Diderot,
Voltaire e outros. Esses pensadores passam a defender um governo democrático,
com ampla participação popular e fim de privilégios de classe e ideais de
liberdade e igualdade como direitos fundamentais do homem e tripartição de
poder. Essas idéia dão o suporte definitivo para a estruturação do Estado
Moderno.
Liberdade,
igualdade e fraternidade. São esses os direitos que vão sintetizar a natureza
do novo cidadão. Essas ideais, esse pensamento este desejo não nasceram do
nada, eles nascem de uma sociedade especifica, com sua estrutura sociopolítica,
cultural e econômica e também não se originam de um dia para o outro. A
revolução não foi simplesmente a obra de alguns homens do século XVIII, mas sim
a culminância de um processo histórico. O mérito da Revolução a acerelou.
As
modernas nações, governos e instituições nacionais surgiram a partir de
monarquias nacionais formadas pela centralização ocorrida no desenrolar da
Idade Moderna. Desde o momento em que o Estado moderno começa a se organizar,
surge a preocupação de definir quais são os membros deste Estado, e, dessa
forma, a idéia atual de nacionalidade e de cidadania só será realmente fixada a
partir da Idade Contemporânea.
Quando
falamos, escrevemos ou pensamos sobre cidadania, jamais podemos olvidar que ela
é uma lenta construção que se vem fazendo a partir da Revolução Inglesa, no
século XVIII, passando pela Revolução Americana e
Francesa
e, muito especialmente, pela Revolução Industrial, por ter sido este que trouxe
uma nova classe social, o proletariado, à cena histórica. Herdeiro da burguesia,
o proletariado não apenas dela herdou a consciência histórica do papel de força
revolucionaria como também buscou ampliar nos séculos XIX e
XX, os
direitos civis que ajudou a burguesia a conquistar por meio da Revolução
Francesa. Ampliando o leque de possibilidades para as chamadas minorias. Contudo
essa história ainda se escreve. 15
A
história da cidadania mostra bem como esse valor encontra-se em permanente
construção. A cidadania constrói-se e conquista-se. É objetivo perseguido por
aqueles que anseiam por liberdade, mais direitos, melhores garantias
individuais e coletivas frente ao poder e a arrogância do Estado. A sociedade
ocidental nos últimos séculos andou a passos largos no sentido das conquistas
de direitos de que hoje as gerações do presente desfrutam.
O
exercício da cidadania plena pressupõe ter direitos civis, políticos e sociais
e estes, se já presentes, são fruto de um longo processo histórico que demandou
lágrimas, sangue e sonhos daqueles que ficaram pelo caminho, mas não tombados,
e sim, conhecidos ou anônimos no tempo, vivos no presente de cada cidadão do
mundo, através do seu “ir e vir”, do seu livre arbítrio e de todas as
conquistas que, embora incipientes, abrem caminhos para se chegar a uma
humanidade mais decente, livre e justa a cada dia.
Bibliografia
EMILIANO,
Jose. História da Cidadania – Uma trilha de lágrimas. Site Pessoal:
Salvador,
jul. 2003. Disponível em http://www.emilianojose.com.br/artigos.php.
Acesso em
7/12/2006.
KOSHIBA,
Luiz; PEREIRA, Denise M. F. História do Brasil. 6.ed. São Paulo:
Atual,
1993.
PEDRO,
A.; CÁCERES, F. História Geral. 2.ed. São Paulo: Moderna, 1996.
PINSKY,
Jaime e PINSKY, Carla Bassanezi. História da Cidadania (orgs) – São
Paulo:
Contexto, 2006.
Parte do
trabalho de Cidadania apresentado na UERJ 2009 pelos alunos: Cândida Maria Ferreira
da Silva, Luciene Souza Matias, Michele Nunes de Morais e Daniel de Paula
Affonso
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